segunda-feira, 27 de abril de 2009

Affonso Romano e o oxímoro da arte

Confesso: eu nunca li nada do escritor e professor Affonso Romano de Sant'Ana, mas simpatizei de cara com ele na palestra "O problema da autonomia do sujeito na arte e na sociedade", na abertura da Semana de Humanidades Uece/UFC [post abaixo], pois ele começou dando um cacete federal em Michel Foucault, Jacques Derrida [tem que pronunciar derridá, se não, não vale] e Gilles Deleuze, os queridinhos de uma certa inteligentzia que ainda campeia pelas páginas dos jornais.
Nem quando era estudante eu gostava muito desse negócio de "a realidade é algo construído", como se a própria não existisse, portanto qualquer distorção tornava-se permitida. Alguns "professores" de jornalismo aproveitavam para dizer que a "verdade" não existia [nem a factual], pois tudo seria um produto da "linguagem".
Também nunca aceitei a tese do "relativismo", que vê como "manifestação de uma cultura, que tem de ser respeitada", mesmo quando isso implica a excisão, a infibulação ou a lapidação de mulheres. Affonso Romano bateu duro nesses dois pontos [ele não chegou a citar o exemplo das mulheres, que fica por minha conta]. Se em vez de jornalista tivesse me tornado um intelectual :), estaria combatendo na mesma trincheira dele, apesar da diferença de gerações [ele deve ser pelo menos uns 10 anos mais velhinho do que eu, pois disse ter visto os Beatles num concerto, quando eles ainda eram quatro].
Affonso Romano começou questionado se existe diferença entre uma ditadura como a do Irã, e uma sociedade democrática, como a Inglaterra, pois, em ambas os cidadãos são controlados: em uma, vigiados pelos aiatolás; na outra pelas câmeras onipresentes. Citou ainda o Patriotic Act, que permitia ao governo americano, sob Bush, vasculhar correspondências e listas de biblioteca para saber quem lia o quê - e comparou tudo ao Big Brother de George Orwell, no livro 1984. [Do BBB da Globo se falará abaixo.]
Deve ter sido também para horror alguns velhos comunista [sim, eles ainda existem] perdidos no tempo, ele pôr como equivalentes os governos da antiga URSS, da China e da Alemanha, sob o nazismo, como as sociedades que "suprimiram o sujeito ao máximo: o [homem] autônomo transformou-se em autômato", ao mesmo tempo em que perguntou: "Será que as sociedades ditas abertas, com a engrenagem do mercado, não estariam produzindo uma falta de autonomia, os indivíduos manipulados como autômatos?"
Admitiu que a geração dele, "de 40 anos atrás" estava "buscando uma utopia" que tem de ser revista "à luz do século XXI", e criticou filmes que continuam a romantizar a figura de Che Guevara. Chamou de "oxímoro" [contradição] a ação "revolucionária" que mata indiscriminadamente por "amor à humanidade"; e recitou seu poema: "As utopias são facas de dois gumes:/num dia dão flores,/noutro/são estrume". [Essa parte ele poderia ter pulado :)] E criticou a frase de Sartre: "O homem é livre para se comprometer", vendo-a como um convite à sujeição, portanto, um "oxímoro", repetiu.
Depois, passou a questionar diretamente a arte "pós-moderna", com seu "culto da fragmentação, do caótico, da apropriação".
"Pensar que um artista é mais livre que um engenheiro é uma irresponsabilidade", pois nem um nem outro pode fazer o "que bem entende", tendo, ambos de se sujeitarem a obrigações éticas: "Não há autonomia absoluta".
Disse que a história ocidental viu "transformações estéticas" na história da arte, desde quando o discípulo era louvado por bem copiar o mestre; passando pela fase em que se passou a admitir o "desvio", até se chegar à ruptura, o que, na época foi "estimulante". Mas que, de ruptura em ruptura, chegou-se a um "beco sem saída". "Uma coisa é a ruptura quando o sistema está organizado; se a ruptura passa a ser o sistema, vai-se romper com o quê?" [Cá entre nós, eu também nunca achei que um penico ou uma tampa de privada fossem obra arte.]
Para Affonso Romano, chegamos a uma época do "culto ao vazio, como se o vazio estivesse cheio" e perguntou por que a "superficialidade" e a "banalidade" nos fascinam tanto. Para ele, "o BBB [da Rede Globo] é a grande metáfora do nosso tempo, é a metáfora do vazio; as pessoas ligam a televisão para ver NADA".

2 comentários:

  1. Ele vai estar às 11h30min no Rádio Debate, na Universitária FM (107,9Mhz).

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  2. Valeu Plinio. A sintese da apresentação do Affonso Romano foi como se eu estivesse lá. Eloisa Vidal

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