sábado, 25 de abril de 2009

Demócrito Dummar

Hoje, 24 de abril de 2009, faz um ano que Demócrito Dummar, o presidente do O POVO, morreu. Dizem que não há pessoas insubstituíveis: discordo. Todas, de um modo ou de outra, o são, pois únicas, e Demócrito em um nível mais elevado. Estivemos ontem na missa em homenagem a ele. Um ano depois, a igreja Cristo Rei cheia.
Demócrito estava para muito além de ser um simples empresário da comunicação; era um jornalista com toda a força de sua alma. Basta ver as frases dele que O POVO publica na edição de hoje, no alto de cada página. Mas os editores esqueceram-se de uma, que é minha preferida: "A hierarquia é uma mesa redonda".
Assim ele tocava o jornal, sem impor suas opiniões, mas argumentando à exaustão. Procurava um ângulo novo, ouvia, perguntava com genuína curiosidade; muitas vezes o vi aceitar argumentos que lhe pareciam bons, mesmo quando esses vinham de repórteres jovens, pois ele não escolhia os interlocutores pela idade ou pelos títulos.
Recentemente, d. Lúcia (mãe de Demócrito) me contou que ele via, como a pessoa mais inteligente que ele conhecia, um dos caseiros do sítio dela, pela ligação, entedimento e a sensibilidade dele em relação à natureza, principalmente dos pássaros que lá habitam. Esse homem, que Demócrito admirava, nunca frequentou uma escola formal. Esse é o Demócrito, que nos suprendia a cada dia, e continuará a nos surpreender pela memória que todos guardaremos dele e que nos encarregaremos de distribuir, tentando emular a generosidade que era a marca mais profunda de sua personalidade.

Mas certamente, ele não ia querer tristeza, conto duas histórias diferentes que captam uma infinesimal parcela do modo como ele via a vida.

- No fim de 2007, quando já esta certo que deixaria a função de ombudsman, saí com três colegas de Redação, Gutemberg, Cláudio Ribeiro e Demitri Túlio para um bar copo-sujo, o Zé Maria, nas proximidades do O POVO. Devia ser umas 10 da noite, ligo para a diretora de Redação, Fátima Sudário, que ainda estava no fechamento do jornal, e ouço a voz do Demócrito: "É o Plínio?"; a Fátima, brincando: "Eles estão fazendo o bota-fora do Plínio do cargo de ombudsman"; Demócrito: "Onde é?, eu quero ir lá". Não se passam cinco minutos Demócrito encosta o carro, desce com d. Vânia (a companheira inseparável) com vestido de festa, para onde iriam ou de onde estavam vindo. O Zé Maria, meio atarantado enxugava as mãos no avental e procurava uma cadeira, que não estivesse quebrada, para oferecer a d. Vânia. Iniciamos um pedido de desculpa, pelo que parecia um transtorno a d. Vânia e ela sorrindo: "Que nada, eu já estou acostumada". Ficamos por lá um bom par de horas. Depois disso, Demócrito sempre perguntava: "Quando vamos voltar ao Zé Maria?"

- Em 2006, o artista plástico Yuri Firmeza conseguiu enganar os jornais da cidade com um fictício artista plástico japonês o Souzareta Geijutsuka. Foram feitas matérias, anunciada a sua suposta exposição, etc. Até que o Yuri revela a farsa e explica que o fez como uma espécie de vingança contra os jornais que não dariam importância aos artistas locais. Eu era ombudsman e estava de férias quando o fato aconteceu. Na volta, ao entrar na Redação observo a revolta de vários colegas por terem sido enganados, alguns não se conformavam, queriam encerrar o assunto. O POVO sustenta o debate por alguns dias. Encontro Demócrito e brinco como ele: "Viu o que fizeram com o seu jornal?" E ele: "Você viu que coisa interessante? Eu acho que devíamos mantido essa discussão por mais tempo". Eu: "Demócrito, você deve ser o único dono de jornal do mundo que está à esquerda de sua Redação".

De fato, as pessoas são insubstituíveis, mas a verdade inevitável é que a vida segue, e não poderia ser diferente. O que nos resta é tentar fazer justiça à memória de Demócrito, dando continuidade à sua obra: O POVO.

2 comentários:

  1. Celina Côrte Pinheiro25 de abril de 2009 às 17:53

    Há pessoas que desencadeiam em mim uma ternura muito autêntica pelos seus valores morais, pela simplicidade que se sobrepõe ao poder temporal de que são detentoras e pela inteligência. Assim me senti diante do Dr. Demócrito, o dono do jornal que, certo dia, me telefonou para agradecer um texto escrito por mim onde eu falava de minhas ligações afetivas com O POVO. "Isso só pode ter sido um trote" - de imediato,pensei. Depois descobri que não fora. Ele realmente me telefonara, confirmando que sua frase sobre hierarquia não se trata de um mero conjunto de palavras. "A hierarquia é uma mesa redonda" retrata muito bem o ser humano que desce de seu pedestal construído pelo mundo e se dedica a vida toda a construir pedestais para as outras pessoas. Dessa forma, ninguém se sente inferior ou pequeno. Como o mundo necessita dessas pessoas maravilhosas, fascinantes, de alma simples, especiais e por tal motivo, insubstituíveis quando saem da cena terrena! O importante é que elas nunca morrem! Sobrevivem ao tempo e à morte do corpo. Que Deus o ilumine sempre, Dr. Demócrito, e que sua genial simplicidade nos contamine!

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